terça-feira, 22 de dezembro de 2009

TRANSPARÊNCIA É TRANSPARÊNCIA




TRANSPARÊNCIA É TRANSPARÊNCIA

João Capiberibe (*)
Muito se fala sobre transparência. O governo federal se coloca na vanguarda sobre este assunto, apontando seu Portal da Transparência como o caminho aberto para o uso do orçamento, mas será que este portal atende as exigências da lei complementar nº 131 (conhecida como lei Capiberibe)? É ele, de fato, transparente?
A seguir, vamos juntos responder a essas questões.
Navegue comigo a partir de agora. Primeiro, abra a página dohttp://www.portaldatransparencia.gov.br/. Três opções de pesquisa aparecerão na tela: 1) Transferências de recursos; 2) Gastos diretos do governo; 3) Convênios.
Vamos navegar na opção “Gastos diretos do governo”:
Selecione “exercício de 2009”;
Clique em “por tipo de despesa”;
A seguir clique em “consultar”.
Na página “Gastos Diretos por Tipo de Despesa” selecione, dentro do “grupo de despesas”, o número 52 (“Equipamento e Material Permanente”) da categoria “investimentos”.
Em seguida, selecione o Ministério da Saúde, vá à Fundação Nacional de Saúde e, por fim, clique em “Fundação Nacional de Saúde – DF”, que esse ano já recebeu R$ 26.490.021,61. Desse total a MMC Automotores do Brasil Ltda. (Mitsubishi) recebeu R$ 16.806.654,24.
Clique sobre esse favorecido.
O que vemos?
Apenas uma relação de gastos que não esclarece absolutamente nada sobre o tipo de material permanente adquirido. Conclusão: é possível saber quem recebeu o dinheiro, porém não é possível saber em quê foi gasto.
Para contrapor, examinemos o exemplo retirado do Siafem (Sistema de Administração Orçamentária e Financeira do Governo do Amapá), experiência piloto, iniciada por mim em 2001, quando governador do Amapá. Além da exposição em tempo real, sem códigos ou senhas das despesas, como veremos mais adiante, também era disponibilizado os extratos bancários diários de todas as contas do governo.
Vamos repetir o passo a passo que fizemos com o portal do governo federal, infelizmente, no começo deste ano, o governo do Amapá, alegando mudança de sistema, deixou de expor seus gastos, em tempo real, como vinha acontecendo até 31 de dezembro de 2008.
Vamos lá, clique no link http://www.amapa.gov.br/gastos/consulta.php.
Escolha o ano 2006, depois secretaria estadual de Educação, procure por material de consumo, em seguida defina o período, caso deseje saber os gastos do ano todo, coloque de 01/01 a 31/12.
Finalmente digite o código da imagem e clique em pesquisar.
Dado o volume de informação pode demorar alguns segundos a baixar, mas você terá todas as notas de empenhos emitidas por essa secretaria, no valor total de R$ 225.026.913,22.
Agora vamos ao último passo, com a tecla direita do mouse clique na nota de empenho nº 4001 do dia 25 de junho de 2006, cujo beneficiário MG Rocha recebeu a importância de R$ 1.287.661,10.
Aí então você terá na tela do seu computador uma relação detalhada, item por item, dos alimentos adquiridos, como açúcar, arroz, leite, sal, macarrão, biscoito etc., com seus respectivos preços e quantidade, dessa forma, você poderá comparar com sua nota de compra do supermercado.
Para cumprir com as exigências da lei complementar nº 131, os entes públicos deverão expor em tempo real, todas as notas de empenho de suas compras. Vale lembrar que existe uma regra no serviço público que diz: não pode haver despesa sem prévio empenho.
Entender o significado desta regra é fundamental para evitar que se concretize o desvio do dinheiro do contribuinte. A lei determina a exposição das informações em tempo real, isso significa que os entes públicos serão obrigados a emitir as notas de empenho diretamente na internet, tornando possível a qualquer cidadão não somente fiscalizar a operação, mas impedir, se houver dúvidas da licitude da transação, que o roubo se realize.
Com base na experiência desenvolvida no Amapá, elaborei o projeto de lei, propondo que essa prática se estendesse ao país como um todo. Em 2003, o projeto foi apresentado ao Senado Federal e, no final de 2004, foi aprovado por unanimidade. No dia 5 de maio de 2009, o projeto de lei foi enfim votado na Câmara Federal, em meio aos escândalos sobre o uso das cotas de passagens, recebendo 389 votos favoráveis e apenas uma abstenção. E finalmente, no dia 27 de maio de 2009, a lei complementar nº 131 de minha autoria foi sancionada pelo presidente Lula.
No exemplo que retiramos do Siafem, onde a secretaria estadual de Educação compra produtos para a merenda escolar, caso houvesse a prática do controle social, ou seja, o acompanhamento sistemático das despesas, possivelmente essa compra não teria acontecido.
Veja você mesmo, abra a nota de empenho 4001 e mande sua opinião para http://leicapiberibe.net/fale/ ou você pode postar seu comentário diretamente no portal http://www.leicapiberibe.net.
Esses dois exemplos concretos nos permitem compreender a sistemática dos gastos públicos, em todos os níveis: municipal, estadual e federal.
O primeiro passo é divulgar a existência da lei, depois seguir de perto sua implantação, seja no governo do estado em que você vive, na prefeitura de sua cidade ou, sendo você leitor, um funcionário público, na própria repartição em que trabalhe.
A lei Capiberibe estabelece prazos para sua implantação. As prefeituras com mais de 100 mil habitantes e demais instituições públicas (sejam elas do executivo, legislativo ou do judiciário) deverão expor suas receitas e despesas na rede mundial de computadores, em tempo real, até o dia 27 de maio de 2010.
É preciso aproveitar esse espaço de tempo para aprofundar a discussão, posto que se possa comprovar, pelos exemplos citados, que existe transparência e transparência, diferentes modos de apresentar as informações, sendo uns mais e outros menos transparentes.
A meu ver, o governo federal, que faz intensa propaganda da transparência de seus gastos, precisa ainda avançar um bocado nesta área. A boa informação é aquela que dá ao contribuinte a possibilidade de comparar os preços praticados por órgãos públicos aos de mercado e, assim, tirar suas próprias conclusões.
(*) ex-prefeito, ex-governador e ex-senador do Amapá. Autor da lei complementar Nº 131 de 27 de maio de 2009

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